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Thursday, June 07, 2012

MPB GLS - Parte 1

Untitled Document

MÚSICA POPULAR BRASILEIRA E OS GUEIS (Gays)

Panorama Histórico – Social - Cantos e Representações

- Primeira Parte -
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Trabalho apresentado na conclusão do "CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM LITERATURA BRASILEIRA" da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 2009.
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A publicação deste trabalho no Blog foi dividida em 5 partes
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Para acessar a Segunda Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Terceira Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Quarta Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Quinta Parte, tecle AQUI
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INTRODUÇÃO

Música e bichice. Dois temas que permeiam minha vida.

Aprendi a amar a música com meus pais. Ambos tinham a alma meio romântica, sonhadora, boêmia e a nossa casa tinha sempre – quando não era quebra pau - alguma bela melodia ecoando. Lembro que através deles conheci Noel Rosa, Billy Blanco, Nat King Cole, Dick Farney, Maysa, Miltinho, Doris Monteiro, Carmem Miranda e outros. Já a bichice vem da minha orientação sexual. Homossexual assumido desde tenra infância (nem tanto), passei por todas as fases básicas do processo - da negação à aceitação - até adquirir uma certa tranqüilidade com o destino, com a sorte, com o carma (ruim, diriam alguns).

Este trabalho busca integrar estes dois temas, propondo uma visão da representação guei na Música Popular Brasileira. Porém a idéia de mostrar caminhos deste mapa requer saber de antemão que o terreno a ser trilhado será enganoso, movediço, pantanoso.

Olhar o objeto “homossexualidade”, que histórico-socialmente está associado a conceitos como “errado” - “doença”, “pecado”, “desvio” , “negativo” -, já define que tal pode ser, quando se trata de canções, vislumbrado (leitura de entrelinhas, detalhes, códigos, expressões, etc) ou diretamente identificado (em maior ou menor grau). Isto porque quando a arte quer expressar o “proibido” pode buscar várias trilhas, desde a mais velada à mais explícita – e a vida, a experiência guei permite este leque de visões.

No que se refere à MPB-guei, a vontade ou a intenção de enxergar a experiência homossexual em determinadas canções (não explícitas) pode impulsionar “enxergar chifre em cabeça de cavalo” (super-interpretação das letras). Este é um risco que pode levar a achados verdadeiros ou completamente enganosos, e quem em última análise teria o poder de afirmar qualquer conclusão, seriam apenas os compositores. Porém, mesmo que a possibilidade do erro, do equívoco exista, isto não deve representar impedimento para leituras baseadas em subtextos e outras “formas secretas” embutidas nas canções. Isto aparece neste estudo.

Por outro lado, uma canção onde a homossexualidade é entregue às claras, seja pela letra ou por declarações do compositor, proporciona a leitura direta da vivência guei dentro do olhar do autor (a mensagem manifesta). A MPB traz um rico material neste sentido, desde obras belas e poéticas até a “baixaria total”. Como a proposta seria dar ouvidos a todas as vozes que cantaram (e cantam) a vida guei na MPB, procurei selecionar exemplos de todos os tipos de canções – das mais “bonitinhas” às mais “podres”. Acredito que o conjunto apresentado presta-se a um bom panorama, porém, tenho plena convicção de que o retrato está incompleto.

Para desenvolver / discutir o tema, apoiei-me nos seguintes eixos :

Histórico social : apresenta ambientes sociais (político, sexual, moral, cultural, etc) através de algumas décadas e suas influências – tanto no sentido positivo quanto negativo - para a condição guei no Brasil (como os gueis foram afetados ou não pelas transformações).

Artistas relevantes : destaca alguns artistas (compositores e cantores) que tocaram – ou tocam – (de forma velada ou explícita) a questão guei e que acabaram por criar (ou tornarem-se) referência no assunto. De alguns são analisados aspectos da vida privada – dentro do que considerei relevante ao tema - (e autorias) e de outros apenas as obras. Por motivo de volume e formatação do trabalho, alguns artistas foram deixados de fora conscientemente (ex : Ana Carolina, Marina), sem que isto represente negação de importância dos mesmos para o assunto.

Músicas (análise / interpretação) – tirando as óbvias, esta é uma área que pode ser muito enganosa. Particularmente – e francamente - não concordo com todas as “interpretações gueis” colocadas, mas acho importante registrar até mesmo porque acredito que a discussão cresce e se polemiza. Aqui também fui obrigado a enxugar (e muito) as obras analisadas, o que me doeu.

Identidade guei – mesmo que não se chegue à conclusão alguma, é importante discutir o assunto como forma de identificar / conhecer fenômenos que surgem (no) e povoam o mundo guei. Através destes fenômenos uma (sub) cultura guei acontece e estabelece – em maior ou menor grau - um reconhecimento e compartilhamento (uma aproximação) de idéias que exclui o “outro” - aquele que está fora do “mundinho” (universo guei), seja por desinteresse, indiferença ou condenação.

Resistência – mostra como a construção de uma “cultura guei”, de um “espaço guei” na sociedade (desde guetos às vitrines) advém da ação, da resposta dos “perseguidos” frente às pressões (condenações e violências - explicitas ou não –) as quais estão sujeitos no cotidiano (ou seja, as bichas e as sapatas (as lésbicas) dia a dia suando, lutando por um lugar ao sol). Estas ações e respostas compõem um quadro de resistência que aproxima (ou pretende aproximar) os gueis de outras categorias historicamente perseguidas, como os negros, o que, dentro de determinado olhar (no caso aqui, a religião afro), revela-se verdadeira.

Linguagem guei – o “dialeto guei brasileiro” mostra-se como um sub-produto originado na experiência social, cultural, moral, política, sexual, religiosa, enfim de vida do guei. Este patoá é usado fortemente como forma de comunicação entre os iniciados e é empregado largamente na nova música guei brasileira. O registro de algumas de suas origens e significações ilumina diversas letras de canções, as quais, caso contrário, seriam inacessíveis aos “ignorantes”.

Perfis - depois de analisar diversas canções, é possível traçar alguns perfis psicológicos, de aflições mentais (ou não) recorrentes. Neste sentido surgem personagens, figuras, estereótipos que habitam o imaginário social (dentro e fora do mundinho) quando se pensa em comportamentos gueis. Aqui também o terreno é fértil, porém, mais uma vez o formato do trabalho limita a penetração no tema.

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1 - Retrospectiva Século XX (nova sociedade e sexualidade)
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1.1 - Transformações sociais
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O século XX foi palco de enormes transformações sociais em escala global. A eclosão de duas guerras mundiais (1914-18, 1939-45), a explosão de revoluções regionais (Russa,Chinesa, etc), o caos das artes - com o aparecimento de diversas propostas, escolas e correntes (dadaísmo, surrealismo, expressionismo, cubismo, pop-art, etc) -, o florescimento de novas ideologias e formas de pensamento (socialismo, existencialismo, beatniks, hippies, etc), o avanço das ciências, da medicina, da tecnologia, da industrialização etc, provocaram profundas modificações econômicas, políticas e sociais nos povos.
O impacto deste complexo afetou a observação / percepção humana, principalmente nas últimas décadas do século, sobre aquilo que até então era considerado como “correto”, “certo”, “adequado” a respeito das tradições, culturas, modos, enfim formas de viver e pensar da humanidade. Nesta problemática surgiu a necessidade de novas idéias, novas posturas para conceber os fenômenos científico-sociais-culturais-econômicos que pululavam no mundo. Conceitos até então solidificados, arraigados, necessitavam de novos significados.

Nas sociedades democráticas, fundamentadas principalmente numa visão branco-patriarcal de poder, grupos até então marginalizados (mulheres e negros, principalmente), viram seus direitos civis reconhecidos após longos históricos de lutas. O desenvolvimento de novas leis, com foco na afirmação dos direitos de igualdade, contribuíram para a valorização do humano como cidadão a ser respeitado na sua particularidade, na sua privacidade, independente de gênero, raça, cor, etc.

A censura, a perseguição política e/ou social , a falta de liberdade, passaram a ser vistas como aberrações, como sofrimento, como erro nas relações em qualquer nível (institucional ou não). A valorização dos direitos humanos, do direito à expressão passaram a ser valores positivos e necessários para a realização dos indivíduos.

1.2 - Revolução sexual

No aspecto sexual, as transformações também ocorreram. Fenômenos como o desenvolvimento da psicanálise, a aparição de estudos com foco científico sobre a sexualidade (ex Relatórios Kinsey (1948) e Hite (1976) - principalmente estes -) , lançaram novas luzes nos diversos tabus que dominavam o pensamento comum. Conceitos até então considerados como “errados” , como “pecado”, como “doença” (ex. masturbação), foram questionados e re-apresentados sob novas óticas.

A introdução da idéia do “natural”, e /ou da simples realização do desejo, em diversos objetos que até então eram vistos como aberrações (práticas, tendências, comportamentos, etc), contribuíram para avançar no conceito do “aceitável” como comportamento e/ou prática.

Referindo-se às mulheres, o avanço das técnicas contraceptivas, a valorização – ou a “descoberta” - do orgasmo, o direito ao aborto, o avanço no mercado de trabalho, tudo contribuiu para revolucionar seus papéis no mundo. O sexo biológico deixou de ser item de definição de atuação social - o que gerou muita discussão a respeito de direitos, e formas de ação - , modificando de forma decisiva as relações masculino X feminino. Era a Revolução Sexual.

Isto falando do mundo heterossexual.
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1.3 - Revolução sexual e os gueis
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Se considerarmos a medicina, com sua pretensão cientificista-higienizadora nas mais diversas áreas psico-biológicas, como definidora do certo e errado no comportamento humano, teríamos que considerar os gueis como “doentes” até 1990, quando então a OMS (Organização Mundial de Saúde) retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças.

O simples fato desta “desclassificação” ocorrer na última década, indica a sombra ameaçadora sob a qual os gueis (os “doentes”) viviam no século passado.

Até então discursos médicos sobre a homossexualidade eram (ou poderiam ser) fundamentados na idéia de aberração, de monstruosidade, da patologia bio-psíquica, a qual, obviamente, era passível de “tratamento e cura”.

Vejamos dois exemplos registrados por Aldo Sinisgalli – médico legista, paulista, com atuação na área de “antropologia criminal” na década de 30:

Os homossexuais, os pederastas, não são homens normais. Como anormais precisam de tratamento adequado. A punição, reclusão em presídios, é injustiça e não traz o mínimo resultado prático. Deixar em liberdade elementos perniciosos é perigoso e prejudicial à sociedade. Logo, um instituto para pederastas se faz necessário. No instituto para pederastas estes seriam tratados, reeducados. Far-se-ia a seleção profissional, gozando os invertidos de uma relativa liberdade. Propugnamos por um dispositivo legal permitindo a internação dos pederastas perniciosos ao meio social nesse instituto.(apud TREVISAN, 2007, pág, 206):

ou

O homossexualismo é anti-social. O homossexualismo é a destruição da sociedade; é o enfraquecimento dos países. Compreende-se facilmente o prejuízo que traz à sociedade e às nações o desenvolvimento do homossexualismo, sabendo-se que os invertidos encontram a satisfação genésica com indivíduos do mesmo sexo, desprezando as mulheres. A maioria dos pederastas não se casa, não constitui família. A grande maioria deles é constituída por moços solteiros. Portanto o pederasta não contribui para o engrandecimento, para o desenvolvimento da sociedade e do país. Se o homossexualismo fosse regra, o mundo acabaria em pouco tempo. (apud GREEN;POLITO, 2006)

Homofobia
O ranço apocalíptico destas afirmações dá o tom do ambiente social ao qual os gueis estavam expostos. Obviamente tal ambiente era sinônimo de uma vida de clandestinidade emocional, uma vida de frustração, de impossibilidade de realização e de uma existência plena..

Isto demonstra que as conquistas da Revolução Sexual não avançaram do mesmo modo nos direitos dos homossexuais. Sob pesadas hostilidades religiosas, políticas, científicas, tradicionais, sociais, etc, os gueis enfrentaram – e enfrentam – diversos obstáculos para terem seus direitos reconhecidos e poderem expressar seus sentimentos e emoções. Desta forma, vivendo numa sociedade onde sua forma de vida é condenada (explícita e/ou veladamente), os gueis ainda são alvos de agressão (moral e/ou física - muitas vezes resultando em mortes)

Don Kulick (2008,pág..47) comenta a violência a qual as travestis baianas – e de resto as brasileiras - estão sujeitas.

[...] se alguns homens mostram-se (....) atraídos por travestis, muitos outros lhes são francamente hostis. Elas precisam estar preparadas para enfrentar comentários desairosos (que partem tanto de homens quanto de mulheres) e tentativas de agressão física (por parte daqueles) (...) Á noite os perigos são maiores (...) A exposição coloca as travestis em posição vulnerável, alvo fácil do assédio de policiais, motoristas, transeuntes, gente que passa de automóveis e ônibus. Na maioria das vezes, a violência vem na forma de agressão verbal, mas não são raros os casos em que gangues de jovens espancam travestis. Também é comum ver gente que passa de carro lançar pedras e garrafas sobre elas. Algumas vezes chegam a disparar armas de fogo contra travestis em plena rua. Normalmente as pessoas que cometem esses crimes não são identificadas nem detidas. E quando o são, recebem penas leves da Justiça.

Nesta condição, medo, baixa auto-estima, repressão, perseguição, violência, preconceito faziam – e fazem – parte da vivência guei. A clandestinidade, o abafamento dos sentimentos, a mentira social, atrai o silencio e a marginalização. Os gueis estabelecem-se à margem, na periferia da sociedade. Não existe inserção, inclusão plena. O modo guei é associado ao pecado (coisa do demônio), à doença (passível de “tratamento”), falta de vergonha na cara, efeito do carma, influência de más companhias, resultado de traumas, ou seja, sempre negativo.
Execução de gays no Iraque

Os gueis (bichas, veados – ou “viados” -, invertidos, pederastas, etc) respondem a isto de diversas formas. Ocorre desde a repressão / sublimação dos desejos (a clandestinidade total – viver toda a vida numa mentira, viver “no armário”) até o escracho total (chutar o pau da barraca), usado como forma de agressão e auto-afirmação, Dentro deste universo de extremos, os gueis vivem sua condição. Um universo difícil de embates pessoais, familiares, religiosos, sociais, etc.

É inegável que no Brasil, mais recentemente, ocorreram alguns avanços nos direitos dos homossexuais (adoção, contrato de parceria civil, compartilhar planos de saúde, pensão alimentícia, etc), porém isto não se traduz na plena aceitação do guei na sua condição de cidadão, na sua integridade emocional, na sua extensão de espírito.

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2 - Gueis e a Arte
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2.1 - Gueis e representação artística
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Como forma de representação da vida (e suas variantes), a arte reconhece e reflete – nas suas mais diversas formas - os fenômenos sob os quais os homens experimentam a verdade, a mentira, o lógico, o abstrato, o enigma, o mistério, o revelado, o baixo, o alto, o gozo, a dor, enfim a existência.
Neste espaço alargado de inúmeros caminhos, sob as mais diversas idéias, intenções, inspirações, criações, etc - o encontro homossexual se viu representado desde a antiguidade nas mais variadas óticas e culturas.

Porém, como a representação da “condição homossexual” resume-se no final das contas em registrar o sexo - ou o amor, as emoções, as tendências, as compulsões - praticado por (ou em relação a) seres do mesmo sexo (os iguais), o que conhecidamente não é amplamente aceito – o leque de possibilidades de apresentação do assunto pode ir desde o explícito ao mais dissimulado (mascarado, disfarçado), além do dúbio. E a forma, o tom da apresentação vai depender sempre da intenção do autor. Escracho, deboche, agressão, escárnio, condenação, celebração, aceitação, explícito, implícito, fantasia, verdade, mentira, pulsão, compulsão, etc, são termos que podem ser empregados na análise (na interpretação) de uma obra com foco no assunto - ou que “toca” o assunto - .

Diante desta grande variedade de possibilidades de aproximações, estabelece-se o risco do erro, do engano interpretativo, porém, ao mesmo tempo surge o desafio de penetrar no mistério, no oculto, no alargamento da visão, e conseqüente descoberta e revelação de outras leituras, o que enriquece o material dando-lhe novas significações.

O material artístico guei, permite este tipo de experiência.
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2.2 - Gueis e a Música Popular Brasileira
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A música, como exemplo de forma cultural inerente ao humano, traz dentro de sua força vários discursos que representam a vida - num sentido amplo -, e a MPB traduz esta idéia com uma riqueza de conteúdo ímpar. Neste sentido, os gueis, como fenômeno social real, apresentam-se na MPB desde os primórdios das gravações mecânicas (1902).

No que se refere ao velado - ao dissimulado, ao disfarce - letras de duplo sentido, frases alegóricas, símbolos, gírias, alusões, interpretações, referências, etc, contribuíram – e contribuem - para identificar (às vezes com uma “forçação de barra”) a “intenção guei” de uma canção.
Por outro lado, canções explicitamente gueis apregoam (jogam na cara) ao que vieram e não deixam dúvidas sobre suas intenções.

Neste universo – seja intencional ou mascarado –, o guei se viu – e se vê - retratado na MPB das mais diversas formas, com as mais diversa conotações, com os mais diferentes intentos e propósitos, ou seja, sempre inserido na cultura musical nacional.
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3 - MPB Guei - Primórdios
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3.1 - O bonequinho.
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Bahiano



Em 1903 surge uma canção que talvez seja a primeira referência bicha na MPB. A cançoneta O bonequinho gravada pelo ator Lino, em nossa pioneira gravadora, Zonophone, e mais tarde regravada na Odeon por Bahiano - o cantor mais popular de sua época.

O bonequinho


Lá da moita, lá da moita sossegado / Sem desastres no caminho / Francisquinho, Francisquinho / Batizado com alcunha o bonequinho / - Ai, ai. As pequenas quando me vêm ficam com os olhos ternos / E depois elas cantam assim: - Ai que lindo o bonequinho! / (Que culpa tenho eu de ser bonito') / Minha mãe quando eu nasci, mui risonha e presenteira / Ficou doida de alegria e disse assim (logo) pra parteira: - Oh comadre que lhe parece, hein? Que beleza de neném! / Que mãos, que pés, que cabeça e que ... ! / Ai que lindo o bonequinho! / A parteira toda ouriçada foi contar à vizinhança, / Essa nova espalhou-se e começou, pois, a festança. / (Falado): A princípio acharam graça, mas mais tarde, / Quando me viam na rua a imitar minha mãe ... / (Viram) que era um (menino), tinha uma cabeça bem-feita, / Uns braços redondos e ... / Ai que lindo, bonitinho, ai que lindo o bonequinho!


Clique abaixo para ouvir O bonequinho
 

O historiador José Ramos Tinhorão (apud FAOR, 2006, págs. 363 e 364) explica melhor quem era então esse Bonequinho e onde ele circulava.

Acredito que o bonequinho era uma forma de indicar que o cara era bicha, assim como tinha o termo 'almofadinha', criado pelo J. Carlos, para definir o rapaz arrumadinho, que se vestia com certo exagero. Nessa época, o homem usava bengala por elegância e entrava em moda o uso de um paletó, muito cinturado e preso ao corpo, que fazia sobressair a bunda. E pode reparar na música que o autor dá a entender que ele tinha uma bundinha bonitinha. E na hora de falar desse detalhe, ele pula, analisa.

Como se vê, os gueis já começaram a incomodar desde os primeiros registros musicais.
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3.2 - Anos 30 – Noel Rosa – pioneirismo
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Noel Rosa
Já nos anos 30, sob os ecos da doutrina nazi-fascista européia, o Brasil embarcou na onda médico-higienista que se outorgava autoridade para definir os padrões que definiriam as melhores qualidades sócio-biológicas para formatar os perfeitos cidadãos habilitados a construir e povoar a pátria mãe exemplar.

Dentro desta linha do “perfeito Frankestein”, seres considerados “inferiores” eram automaticamente relegados ao lixo social (doentes mentais, “sub-raças”, marginais, velhos, aleijados, etc.). Os gueis, obviamente, também eram elencados neste grupo de párias e estavam expostos ao preconceito, a perseguição, a marginalização – e quem sabe, ao extermínio.

Neste clima, aparece uma bela canção de Noel Rosa - Mulato Bamba (Mulato Forte) - que representa um marco na representatividade guei na cultura nacional. Diz a letra :

Mulato Bamba


Esse mulato forte é do Salgueiro. / Passear no tintureiro é o seu esporte, / Já nasceu com sorte e desde pirralho / Vive às custas do baralho, / Nunca viu trabalho. / E quando tira um samba é novidade / Quer no morro ou na cidade, / Ele sempre foi o bamba. / As morenas do lugar vivem a se lamentar / Por saber que ele não quer se apaixonar por mulher. / O mulato é de fato, / E sabe fazer frente a qualquer valente / Mas não quer saber de fita nem com mulher bonita. / Sei que ele anda agora aborrecido / Por que vive perseguido / Sempre, a toda hora / Ele vai-se embora / Para se livrar do feitiço e do azar / Das morenas de lá. / Eu sei que o morro inteiro vai sentir / Quando o mulato partir / Dando adeus para o Salgueiro. / As morenas vão chorar, / Vão pedir pra ele voltar / E ele não diz com desdém: / -Quem tudo quer, nada tem.

Clique abaixo para ouvir Mulato Bamba
 

A ambigüidade – ou não - dos versos são notáveis. Frases do tipo “...ele não quer se apaixonar por mulher” e “...não quer saber de fita nem com mulher bonita”, indicam uma preferência ou uma escolha.

Isto remete a uma leitura guei da canção, porém a coisa não fica só nisto. Referências ao clima de perseguição policial podem se encontrar em “Sei que ele anda agora aborrecido - Por que vive perseguido - Sempre, a toda hora”.

Também há a discussão sobre quem – qual persona guei - teria inspirado Noel a compor Mulato Bamba.

João Máximo e Carlos Didier (1990, pág 220) puxam a brasa para o famoso malandro carioca Madame Satã.

Mas em quem terá se inspirado Noel para criar personagem tão singular como este mulato forte do Sal­gueiro? Todos os bons malandros, do morro ou não, parecem nele contidos, a intimidade com o tintureiro, a habilidade inata com o baralho, a astúcia que o permite viver sem trabalhar, a facilidade com que faz um novo samba. Mas a singularidade desse malandro é outra. De tal feitio que as morenas do lugar se queixam: o mulato em questão simplesmente não quer se apaixonar... por mulher. O bamba forte, corajoso, disposto a enfrentar qualquer valente, mas não querendo saber de fita. Isto é, de amor. Nem com mulher bonita.
Estranho mulato este que em muitas coisas lembra o Satã, um dos mais afamados valentes da noite carioca, capaz de virar do avesso um botequim da Lapa, de encarar um, dois tintureiros (camburão) de uma só vez, sem medo de nada, nem mesmo da morte, quanto mais desses policiais que vivem dando batidas pela Mem de Sa atrás de pederastas que um impiedoso moralismo recomenda sejam varridos das ruas como lixo. É muito comum o silencio da noite ser quebrado pelo alvoroço dessas criaturas correndo em bando, aos gritos, numa desesperada fuga a policiais violentos. Os perseguidores atrás, brandindo cassetetes, os perseguidos na frente, entrando como ratazanas assustadas na primeira porta que encontrem aberta na Mem de Sa, na Riachuelo, na Gomes Freyre ou na Lavradio. Satã, porém, não foge. Terá sido ele o inspirador de Mulato Bamba? Grande, forte, um touro de homem, temido, a própria polícia torcendo para não encontrá-lo pela frente numa dessas batidas, e no entanto acariciando o sonho de se tornar um dia uma esvoaçante estrela dos nossos palcos. Pode ser visto, vestido de baiana, odalisca ou rainha de Saba, a rebolar freneticamente num desses espetáculos que os cabarés da Lapa de vez em quando apresentam, homens travestidos de mulher. Quem vê Satã assim, batom, brincos, pulseiras, mexendo com as cadeiras, cantando com voz de contralto, nem imagina do que é capaz.

A relação de Noel com a noite marginal carioca explica a intimidade com o assunto.

Ele (Satã) e Noel são amigos. Noel, na verdade, tem muitos camaradas entre esses homossexuais que a polícia persegue. Conhece alguns deles. Confessos como Satã e Jota Piedade, bom compositor que em troca de companhia passa adiante os sambas que faz. Ou velados como As­sis Valente e Ismael Silva, que não abrem a guarda com medo de perder o respeito do pessoal do meio. Mas Noel não liga, aceita-os como são. (MÁXIMO e DIDIER,1990, pág 220)

Os autores concluem sua análise homoerótica do samba :

Seu samba - a primeira obra da música popular brasileira a focalizar de modo mais ou menos claro esse tipo de personagem - não deixa de ser um gesto de simpatia. Para com Satã ou outro mulato bamba qualquer. Nele não falta o duplo sentido de que Noel tanto gosta: por quem vive perseguido o valente do Salgueiro, pela polícia ou pelas mulheres? Satã não quer saber de fita nem com uma, nem com outras. E ha o fecho, dois versos sutis sugerindo certo trejeito que Mario Reis, habilmente, para não ser tão obvio, evita ao cantá-los: Ele então diz com desdém: "Quem tudo quer ... nada tem." (MÁXIMO e DIDIER,1990, pág 220)

Em “História Sexual da MPB”, João Máximo (apud FAOUR, 2006, pág 366) reafirma esta possibilidade, "Noel faz essa menção à homossexualidade com muita elegância e categoria. Dizia-se na época que o fez inspirado em Madame Satã (famoso homossexual brigão e malandro do bairro da Lapa)”.

Já João Silvério Trevisan, no livro Devassos no paraíso, registra que esta música supostamente teria sido baseada em Ismael Silva, sambista co-fundador da primeira escola de samba do Rj (Deixa Falar), um homossexual não assumido cuja condição era alvo de comentários na época. “Ismael Silva despertava suspeitas em muitos contemporâneos, com suas letras falando de uma aflição ou ‘dor moral’ que ‘me atormenta noite e dia, uma grande nostalgia’ que me ‘faz penar por ser tão pertinaz’” (2007, pág 283).

De qualquer forma, Mulato Bamba, seja lá baseada em quem for, é um pilar, uma peça histórica fundamental na historia da MPB guei.
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3.3 - Assis Valente - Os dramas de um enrustido
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Assis Valente
Sambista famoso, Assis Valente foi outro personagem que despertou comentários sobre sua sexualidade . Um dos principais compositores do repertório de Carmem Miranda, autor de clássicos como Camisa Listada, Uva de Caminhão, ...E o Mundo não se Acabou, Boas Festas, Brasil Pandeiro, Assis teve a vida marcada por altos e baixos, tanto em termos pessoais quanto musicais. 

Da euforia à depressão, do sucesso ao fracasso, sua triste trajetória foi marcada por diversas tentativas de suicídio (salto do Pão de Açúcar, corte de pulsos) que culminaram em êxito em 1958 quanto o sambista ingeriu guaraná com formicida.

Sua obra é povoada de canções de duplo sentido que faziam a alegria dos gueis de então (seja de forma mais ou menos direta ou através da personificação dos personagens femininos). Carmem Miranda se esbaldava.

Falando de Ismael Silva e de Assis Valente, Rodrigo Faour (2006, pág 366), registra :

Embora nunca confirmado oficialmente por uma série de razões, dois grandes sambistas da velha guarda tinham fama de homossexuais: Ismael Silva e Assis Valente. O primeiro não produziu sambas com muita "pinta", apenas mostrava-se atormentado, aflito, falava eventualmente de uma "dor moral­ que o atormentava noite e dia", que o fazia "penar por ser tão pertinaz". Em compensação, na obra de Assis, há sambas em que seu lado feminino grita, e sua principal intérprete, Carmen Miranda, deitou e rolou em letras deliciosamente ambíguas, como a da esfuziante Camisa listrada, em que um folião se traveste de mulher durante o Carnaval, quando tudo era permitido. E isso foi em 1937.


Camisa listrada

Assis - Camisa Listrada
Vestiu uma camisa listrada e saiu por aí / Em vez de tomar chá com torrada ele bebeu parati / Levava um canivete no cinto e um pandeiro na mão / E sorria quando o povo dizia: sossega leão, sossega leão / Tirou seu anel de doutor pra não dar o que falar / Saiu dizendo "Eu quero mamá, mamãe eu quero mamá, / Mamãe eu quero mamá" / (...) Levou meu saco de água quente pra fazer chupeta / E rompeu minha cortina de veludo pra fazer uma saia / Abriu o guarda-roupa e apanhou minha combinação ... (...) Agora que a batucada já vai começando / Eu não deixo e não consinto meu querido debochar de mim / Porque se ele pega as minhas coisas vai dar o que falar / Se fantasia de Antonieta e vai dançar na Bola Preta / Até o soí raiar

Clique abaixo para ouvir Camisa Listrada
 

Já em E o mundo não se acabou, pode-se ver retratado um guei que, num momento de delírio – notícia da chegada do Apocalipse -, enlouquece, sai do armário, “dá a pinta” e depois se arrepende.

E o mundo não se acabou

Anunciaram e garantiram / Que o mundo ia se acabar / Por causa disso / Minha gente lá de casa / Começou a rezar...(...) Acreditei nessa conversa mole / Pensei que o mundo ia se acabar / E fui tratando de me despedir / E sem demora fui tratando de aproveitar... Beijei a boca de quem não devia / Peguei na mão de quem não conhecia / Dancei um samba em traje de maiô / E o tal do mundo não se acabou...(...) Chamei um gajo com quem não me dava / E perdoei a sua ingratidão / E festejando o acontecimento / Gastei com ele mais de quinhentão... / Agora eu soube que o gajo anda / Dizendo coisa que não se passou / E, vai ter barulho / E vai ter confusão /Porque o mundo não se acabou...(...)

Clique abaixo para ouvir E o mundo não se acabou
 

Em “História Sexual da MPB”, Rodrigo Faour (2006, pág.367) analisa :

Outro sucesso de Assis na voz de Carmem, no ano seguinte, é a superam­bígua E o mundo não se acabou, em que fala de uma pessoa que saiu com um sujeito e "gastou com ele mais de quinhentão", e depois o cara andou dizendo "coisa que não se passou". Mais gay mais atual, impossível: ''Acreditei nessa conversa mole! Pensei que o mundo ia se acabar! (...) Beijei na boca de quem não devia! Peguei na mão de quem não conhecia! Dancei um samba em traje de maiô/ E o tal do mundo não se acabou.

E o retrato da condição do guei avança, mostrando uma prática comum até os dias de hoje (a bicha que banca financeiramente um bofe – “homem” -)

Na segunda parte fala de um assunto tão comum à comunidade, ainda mais daquela época: o do gay que banca (financeiramente) os “homens” que transavam com eles, e que nem sempre assumiam ter-se prestado a este papel. Veja se não faz sentido: "Chamei um gajo com quem não me dava! E perdoei a sua ingratidão/ E festejando o acontecimento/ Gastei com ele mais de quinhentão/ Agora eu soube que o gajo anda! Dizendo coisa que não se passou/ Ih! Vai ter barulho e vai ter confusão/ Porque o mundo não se acabou." (FAOUR,2006, pág 367)

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O interessante é que algumas letras de Assis prestam-se a leituras bem diferenciadas, dependendo do ponto de vista. É o caso de Uva de Caminhão (1939), gravada por Carmem.

Uva de Caminhão

Já me disseram que você andou pintando o sete / Andou chupando muita uva e até de caminhão / Agora anda dizendo que está de apendicite / Vai entrar no canivete, vai fazer operação / Oi que tem a Florisbela nas cadeiras dela? / Andou dizendo que ganhou a flauta de bambu / Abandonou a batucada lá da praça Onze / E foi dançar o Pirulito lá no Grajaú / Caiu o pano da cuíca em boas condições / Apareceu Branca de Neve com os sete anões / E na pensão da dona Estela foram farrear (. . .) / Você no Baile dos 40 deu o que falar / Cantando o seu Caramuru, bota o pajé pra brincar (. .. ) / Eu não te dou a chupeta, não adianta chorar

Clique abaixo para ouvir Uva de caminhão
 

Numa leitura, digamos “hetero”, o samba assume uma conotação “feminina”.

Para Ruy Castro, biógrafo de Carmen, o samba fazia referências "nada cifradas a sexo, gravidez e aborto". (apud FAOUR, 2006, pág 368)

Já sob outra ótica, o mundo guei explode :

Em contrapartida, Trevisan analisou por outro viés em seu livro as nuances desta letra. Assis, brincando com outras músicas de carnavais passados, teria enumerado diversos símbolos fálicos neste samba, como a "flauta de bambu", o "pirulito" e a "chupeta", advertindo ainda que o cara "andou chupando muita uva, até de caminhão". E foi por isso que precisou entrar no "canivete", alegando apendicite - quando muito provavelmente seria ... hemorróida (!). E ia além, em versos como "O que tem a Florisbela nas cadeiras dela?", depois cita Branca de Neve (seria apelido de bicha?) e seus sete anões, indo todos farrear na pensão da dona Estela e que no baile "deu o que falar", cantando o "Seu Caramuru". A canção terminava numa audácia debochada: "Não te dou a chupeta, não adianta chorar! Mamãe eu quero mamá." Ai, meu Deus, que chupeta será essa que esse sujeito procurava? Talvez Trevisan tenha razão ... (FAOUR, 2006, pág 368 - 369)

Dentre sua obra não gravada, há uma letra – provavelmente de um samba - que chega às raias do explícito no desejo guei. Duro com Duro já revela no título a intenção (sob um olhar “pau com pau”). E a letra é um primor do amor que não ousa dizer o nome.

Duro com Duro


Meu bem, tudo acabado, / Cada um para o seu lado / Nosso amor não nos convém. / Você o que pensa faz / Eu também não fico atrás / É sabido que há mal que vem pra bem / Em plena liberdade / Viveremos a vontade / Sem mentira e humilhação / Ser feliz, na aparência / Eu não tenho paciência / Nem devo escravizar meu coração (...) / Sei que você tem prazer / Vendo alguém padecer / Eu também sou assim / De maneira que a nossa união / Seria um horror, não me diga que não ! / Pois duro com duro / Não faz bom muro !

Se esta letra tivesse sido musicada e gravada, certamente figuraria como um dos marcos do cancioneiro bicha brasileiro.

Assis e Carmem Miranda
Infelizmente Assis foi uma vítima de seu tempo. Vivendo numa sociedade repressora, foi obrigado a abafar seus sentimentos encenando uma farsa social – inclusive casamento – que acabaram por destruí-lo.

Em “Assis Valente – A jovialidade trágica de Jose Assis Valente” – Francisco Duarte Silva e Dulcinéa Nunes Gomes (Funarte – 1988), os autores comentam a possibilidade do sambista não ter um destino trágico caso tivesse resistido até a década de 60, quando então, sob novos ares sociais, poderia ter encontrado espaço para viver melhor seus sentimentos.

A luz de uma análise mais profunda, e se tivesse tido garra para sobreviver até os anos 60, talvez ele se compreendesse melhor e se justificasse. Era um ser que nunca gozou de paz interior. Eros e Psique brigavam dentro dele. (Op. Cit., pág 217)

Referindo-se a ambigüidade emocional do sambista, os autores distinguem duas personas brigando por sua alma: Assis, a pública, a social - e José, a íntima, a privada.

Insatisfeito com seu dualismo, naquela existência Assis buscou para José uma saída : para seu jovialismo trágico e incurável só encontrou a porta da autodestruição. Assis matou José porque não gostava de sua maneira de ser, porque não se gostava como era. (...) José viveu uma vida irreal.
Há na história dos homens muitos casos semelhantes. Muitos outros seres que por impulsos interiores (até para eles inexplicáveis) buscam ser o que não podem de maneira adequada.
Na história moderna ou na antiga, os fatos são claros : Rock Hudson, Fernando Pessoa, Gore Vidal, Virginia Wolff, Prous, André Gide, Michelangelo, Petrônio, Platão (...) também subsistiram numa vida desajustada, tanto mais intolerada ou aceita em função do tempo / época / meio em que viveram.
“Os descendentes de Platão vivem o amor grego. Nossa natureza tem sede do mal, e ao bebermos, perecemos.” (William Shakespeare)....(op. Cit., pág 217 - 219)


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Trabalho apresentado na conclusão do "CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM LITERATURA BRASILEIRA" da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 2009.
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A publicação deste trabalho no Blog foi dividida em 5 partes
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Para acessar a Segunda Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Terceira Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Quarta Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Quinta Parte, tecle AQUI
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